quarta-feira, 16 de setembro de 2009

O cavalo e o Gaúcho

“... E eu me orgulho – vos digo com franqueza,
Pois quem não sente orgulho pelo pingo
Não nasceu nestes pagos, com certeza!”
(Vargas Neto)

Não há história neste Estado, que não se fale em cavalo! Mouros, Zainos, ou Rosilhos, em cada capítulo, há sempre um gaúcho a Cavalo!
O Gaúcho a pé, é um assunto “moderno”. Aconteceu com chegada dos Imigrantes, principalmente Italianos e Alemães, povos ligados a terra, lavoureiros de procedência. Não menos gaúchos, nem menos importantes, pelo contrário, em quanto as guerras se faziam em lanças e cargas de cavalarias, eles abasteciam os celeiros na guerra do dia a dia com enxadas e carretas!
Não se sabe bem ao certo como o cavalo chegou por aqui! Fernando O. Assunção, no livro El Gaucho, cita um documento do dia 23 de maio de 1493, em Barcelona, em que os Reis Católicos Isabel e Fernando, ordenam a D. Pedro de Mendoza, o envio de 25 Cavalos e Cavaleiros para a América, e ainda cinco cavalgaduras de reserva, e que estas cinco sejam éguas.
Em 1768, quando os jesuítas foram expulsos, só na região das Missões existia perto de duzentos mil cavalos, mesmo depois dos rebanhos terem sido saqueados pelos índios infiéis que iam até as proximidades dos “Povos” fazer grandes arrebanhamentos para vender aos portugueses. Esta enorme quantidade de cavalos não se explica apenas com estes 30 cavalos trazidos por D. Pedro de Mendoza, visto que as éguas dão apenas uma cria por ano, e destes trinta cavalos, provavelmente apenas os 5 reservas eram éguas, pois para as Cavalarias, se preferiam os Garanhões!
O mesmo Fernando O. Assunção cita que este crescimento populacional exponencial, teve a participação de índios chilenos que trouxeram cavalos “transandinos” dos vales andinos, também de origem Espanhola, e que estes se multiplicaram nas planícies da Pampa Gaucha (Uruguai, Argentina e Rio Grande do Sul).
Se não sabemos como chegaram ao certo, ao menos imaginamos como se desenvolveram! Vastas planícies, campo de sobra para as manadas em desenvolvimento, para com o auxilio da Natureza, forjar o sangue rude e guapo dos Crioulos gaúchos de pura cepa Riograndense, como os “Mouros de Ferro” de D. Martins, alusão aos cavalos “Marca de fisga” das Cabanhas Cinco Salsos de Bagé e Aceguá e La Invernada, do Uruguai, onde predominam as pelagens Moura e Rosilha, e em sua principal característica, a Resistência interminável!
Lá por 1600, aproximadamente, me parece que alguns índios já começavam a desenvolver técnicas para amansar e domar estes cavalos, então “selvagens” para as suas montarias, já que o conflito com os colonizadores era inevitável! Hoje muito se fala em doma racional, “encantadores de cavalos”, açúcar no lugar do chicote, mas os índios já nesta época entendiam de tudo isso!
Domavam de acordo com a natureza de cada individuo, sem bocal nem rédeas, o comando era dado apenas com as pernas e alguns sinais sonoros. O cavalo do índio da Pampa Gaucha, aprendia a galopear boleado (maneado por boleadeiras), galopear com a cabeça tapada, galopear em campos acidentados, banhados, charcos e tacurus, bem como cruzar rio cheio com o índio agarrado a cola, saltar obstáculos ou mesmo permanecer imóvel, por horas a fio, aguardando momento certo para alguma ação!
Talvez daí trazemos esta ligação com o cavalo! Não há povo mais identificado com a figura do Centauro, que o Gaúcho! Nascemos, crescemos e desaparecemos a Cavalo. Ah! Vida perfeita! Arrisco até dizer que por aqui, o cachorro é o segundo melhor amigo do homem, por que o primeiro há de ser o cavalo! Ao menos do homem gaúcho!
O Poeta Guilherme Schultz Filho, em seus versos “Retrato da alma Gaúcha”, expressou de melhor maneira impossível, a importância do cavalo em cada fase da vida do Gaúcho:

“...Em cada ronda da vida
eu tive um pingo de lei...”

Quando ele era menino, além de uma egüinha bragada da cor da alvorada, tinha um peticinho faceiro, overo, com o nome de Fantasia - o alimento de toda criança.
Quando moço:

“Era um ruano - ouro nas crinas!
festejado pelas chinas
que o chamavam “Sedutor”

Já adulto, escolheu um bagual “mouro fanfarrão”, que refletia a sua alma indomável:

“O meu cavalo de guerra, chamava-se "Liberdade"!
Chomico! Quanta saudade, me alvorota o coração!
Era um mouro fanfarrão, crioulo da própria marca
e eu ia como um monarca, na testa do esquadrão”.

Depois, com o passar dos anos, a experiência da velhice lhe fez escolher um picaço bom de trote:

”O cavalo que eu encilho
nesta quadra da existência,
dei-lhe o nome de - “Experiência”.

E o poeta encerra com os seguintes versos:

“E, assim, vou descambando. ao tranco e sem escarcéu...
Sempre tapeado o chapéu, por orgulho de gaúcho
e se Deus me permite o luxo, entro a cavalo no céu!”

O cavalo nos dá assunto pra escrever um jornal inteiro! Mas por que não deixar assuntos para as próximas edições?
Para encerrar, um verso do maior poeta gaucho!

... Tenho certeza no pealo / e laço de toda trança.
Desde os tempos de criança / sempre andei bem a cavalo,
Cacho atado a Cantagalo, / bem sentado no lombilho,
Isso vem de pai pra filho, / é balda da nossa gente
E sempre fui exigente / pra cavalhada que encilho!”
(Jayme Caetano Braun)

Henrique R. Noronha
Médico Veterinário
henriquenoronha@pop.com.br

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1 comentários:

Leandro de Araujo disse...

Buenas, chê Henrique.
Gracias pela visita e pelas palavras.

Certa vez me disse um poeta que o texto, quando ganha o "papel", tem vida própria e como um filho tem o direito de seguir o mundo.
Claro que podes usar o "Respeito" no teu blog. Belíssimo blog, diga-se de passagem.

E para mim um prazer se seguires acompanhando minhas histórias, e comentando-as.

No mais, era isso.

Baita abraço.

Leandro de Araújo.'.