quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Cancioneiro das Coxilhas

Oh de casa! Oh de casa!
Quanta alegria se sente
Quando alguém nos recebe!...

Assim, em uma tarde destas de sol, chegamos na Capital para uma visita há muito esperada e que muito engrandece este jornal. Na porta à nos receber: Neura Bertussi! Uma dos oito filhos de Honeyde Bertussi, um ícone da música e da história deste Estado!
Era uma vez, lá no Rincão da Mulada... bem poderia começar assim esta história, devido a grandiosidade e aos encantos que encerra! A Criúva, na época interior de São Francisco de Paula, hoje de Caxias do Sul, viu nascer e se forjar os “Cancioneiros das coxilhas”, denominação que apresentou Honeyde Bertussi ao Brasil e em seguida a dupla “Irmãos Bertussi”, a primeira dupla de acordeonistas do país, com Honeyde e seu irmão Adelar Bertussi.
Tentamos nesta tarde histórica reviver momentos pitorescos da trajetória Bertussi, momentos ímpares, fatos memoráveis do homem Honeyde Bertussi e não do artista. Tentamos, porém sem grande sucesso! Separar a história pessoal do Honeyde de sua arte é uma tarefa praticamente impossível para nós!
Autodidata, encantado pelo acordeon desde guri, construiu assim sua ilustre trajetória na música. Da música ergueu sua família. De sua desendência, oito filhos, todos “formados”, algo que para ele era motivo de orgulho. Até mesmo o irmão Adelar foi influenciado a estudar. Em uma época onde usar bombacha era “grosseria”, ele pensava que ao menos tendo um “diploma” poderiam ajudar a desmanchar esta imagem.
Além de Adelar, Honeyde também fez dupla com seu filho Daltro, formando a dupla “Os Bertussi”, nome mais tarde adotado por Adelar e que segue até hoje, com Gilnei Bertussi, filho de Adelar.
Perfeccionista e estudioso, levava a gaita e a música com extrema seriedade, bem como sua apresentação pessoal e de seus acompanhantes, todos que os cercavam eram “impulsionados”, estimulados a estudar música a fundo, a entender a música, na prática e na teoria!
Nesta busca incessante pela perfeição, criaram o estilo “Bertussi” da música gaúcha, a música serrana, uma marca, uma identidade, um “toque” inconfundível mesmo para gerações mais novas que não puderam acompanhar de perto o seu trabalho!
Honeyde sabia da responsabilidade que carregava pela valorização das nossas verdadeiras raízes e pelo fortalecimento do tradicionalismo gaúcho! Com sua música autêntica, “Os Bertussi” adentraram o Brasil, divulgando nossa arte. Foram shows no Rio de Janeiro, São Paulo, Manaus e diversos outros locais deste imenso país.
O sucesso total de sua discografia veio pelo esforço que dedicaram a música! Sem nunca ser “comercial”, a preocupação era acima de tudo com a perfeição e com autenticidade. Com ritmos e sotaque gaúchos, teve o prazer de ver seus discos rodando até mesmo em rádio do exterior!

E pensar que toda esta trajetória começou lá na Mulada, com a Banda do Seu Fioravante, pai de Honeyde e Adelar. A família sempre foi ligada a música. Aos dezoito anos Honeyde decide vender alguns bois e investir em uma gaita. A família não achava isso “nenhuma maravilha”, visto que a música nem era considerada uma profissão de grande prestigio na época.
Em poucos meses Honeyde já esta animando o primeiro baile de sua carreira. A orquestra que iria animar uma festa em São Jorge da Mulada foi impedida de chegar devido a uma chuvarada que encheu o rio da Mulada, isso em 1942, tiraram o Honeyde da cama para dar um jeito de animar a festa pois o “povo” já estava reunido! E lá se foram, Honeyde e o irmão Valmor, gaita de boca, violão, chocalho e acordeom, foi um sucesso!
Assim como este, outros bailes de “cinema” foram acontecendo em sua carreira. Compromissado com o público, não aceitava que qualquer obstáculo o impedisse de comparecer a um compromisso e animar um baile, nem que para isso fosse preciso bater de porta em porta na vizinhança para pedir lampiões emprestados e tocar um baile bem no meio do salão, afinal, não ia perder uma festa destas só porque faltou luz!
Como tudo na vida não são só alegrias, também ocorreram fatos que o marcaram com tristeza, como um baile que foram contratados para animar no interior do estado e lá encontraram o salão dividido ao meio, do lado direto os brancos, do lado esquerdo, os negros, e no meio, lá no palco Os Bertussi. Com o compromisso de animar a festa mas contrariado “como gato a cabresto” com aquela “divisão”. Tristes e indignados com o fato que ali assistiam e que também dividia suas mentes! Para que lado olhar? Para quem tocar? Quem merece mais atenção? Em fim, por que dividir se somos todos irmãos?

E lá se foi a nossa fantástica e histórica tarde!
- Essa vocês não podem deixar de escutar! (era a musica Novidade Velha)
- Só mais esta! Está é o “Rei do Chotes”, papai dizia!
Assim vieram mais umas quantas música e a Neura não nos deixava ir embora. Que orgulho e que brilho ela carregava nos olhos ao falar dos feitos de “Os Bertussi” e principalmente do “papai” Honeyde!
Assunto? Este tínhamos para mais umas quantas edições do Jornal da Querência, mas nosso tempo era curto, e apesar da fantástica recepção que tivemos, fomos nos dirigindo a porta, e ainda escutando algumas daquelas história “encantadas”!

Não há como não querer voltar lá e compartilhar mais um chá daqueles, recheado de tantas histórias!


Obrigado “Tia Neura” (que assim me permito chamá-la) e seu esposo Danilo Todeschini pela fantástica tarde que tivemos!

Henrique Noronha

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